O manual de negócios, ao longo dos tempos, sempre estabeleceu dois caminhos principais para as empresas em tempos de crise. O primeiro, é o de maior controle dos custos para conseguir sair o mais rápido possível da situação de baixa nos resultados. O segundo, mais ousado e arriscado, é investir acima da demanda, buscando captar maior market share.
A pandemia mundial causada pela Covid-19 tem gerado impactos negativos terríveis para pessoas ao redor do mundo, a começar pelas milhões de mortes, passando por inúmeros problemas de saúde, físicos, mentais e emocionais, derivados do confinamento, do medo e da incerteza em relação ao futuro. E, como se não fosse pouco, há também o impactos na economia, com desemprego e recessão.
Tudo isso é devastador e não deve ser jamais minimizado. Ainda assim, a situação vivida mundialmente há mais de um ano, trouxe também mudanças importantes na forma de se fazer negócios e, algumas destas, aceleraram tendências e geraram novas oportunidades. E é justamente aí que as startups podem se sobressair. Empresas jovens, com estruturas simples e processos desenhados sob medida, tendem a ser mais ágeis em reagir a eventos de fora. Sem as amarras e burocracias de grandes corporações, as startups costumam, portanto, adaptar-se mais rapidamente a novas realidades e se beneficiam dessa maior velocidade. A seguir, enumero algumas dessas mudanças e as oportunidades relacionadas a elas.
- Maior digitalização: Uma pesquisa global realizada pela Deloitte (Deloitte Global Marketing Trends Consumer Pulse Survey) identificou que 66% dos respondentes concorda com a afirmação de que a pandemia da Covid-19 aumentou a sua apreciação por tecnologias bem desenhadas e 63% concorda que vai passar a usar mais tecnologias digitais do que costumava fazer antes da pandemia. A mesma Deloitte, em uma pesquisa com gestores de companhia (Deloitte Global Marketing Trends C-suite Survey), identificou que, por conta da pandemia da Covid-19, 67% das empresas aumentaram a sua presença em mídias sociais, 57% fez alterações significativas em suas plataformas digitais para melhor atender as necessidades de seus consumidores e 49% aumentou o número de eventos e workshops virtuais. Toda essa escalada na digitalização das companhias traz grandes oportunidades de negócio para startups da área de tecnologia. Martech, Adtech, Fintech, Healthtech e outras muitas techs são todas indústrias que têm conseguido aproveitar-se dessa tendência para escalar seus negócios e ganhar musculatura, crescendo em um ano o que talvez não conseguissem crescer em dois ou três.
- Crescimento do e-commerce: Dados do Webshoppers, o maior relatório de vendas on-line do país, apontam que o Brasil atingiu a marca de 41 milhões de consumidores pela internet no primeiro semestre de 2020, um aumento de 40% em relação ao mesmo período de 2019. O mesmo relatório também indica que no terceiro trimestre de 2020, 93,4% dos consumidores disseram que pretendiam comprar alguma categoria de produtos pela internet, um aumento de 6,7 pontos percentuais em relação ao mesmo período do ano anterior. É consenso entre especialistas da área, que o crescimento acelerado, produzido pela pandemia, veio para ficar e que a curva não deverá baixar depois que ela passar. Inúmeras startups, cujos negócios estão apalancados nesta via de vendas, viram-se beneficiadas pela tendência e têm conseguido colher resultados muito positivos para os seus negócios. Aquelas que souberam investir em boas experiências de navegação e compra e aliaram ferramentas e tecnologias às suas ofertas, certamente colheram frutos ainda melhores
- Trabalho remoto: A pandemia, da noite para o dia, obrigou a grande maioria das empresas, principalmente as de serviços não essenciais, a mandarem todos os seus colaboradores para casa e instaurar o trabalho 100% remoto. Reuniões passaram a ser todas virtuais e os trabalhos em equipe precisaram ser feitos à distância. Para muitos setores mais tradicionais, essa foi uma importante quebra de paradigma, mostrando ser possível realizar, com resultados similares, trabalhos que antes eram feitos presencialmente, de forma remota. Para startups, que muitas vezes têm recursos mais escassos, poder trabalhar remotamente, trouxe oportunidades de redução de custos com escritório e deslocamentos, que podem fazer a diferença na contabilidade final. Por outro lado, toda essa onda de trabalho à distância, abriu também novas frentes de atuação para estas empresas, que puderam passar a atender clientes em outras regiões do país, que antes privilegiavam parceiros locais conhecidos, abrindo caminho para colaborações de longo prazo.
- Desvalorização cambial: O Real brasileiro sofreu, desde o início da pandemia, uma desvalorização significativa frente a outras moedas mais fortes, como o Dólar e o Euro. Esse fator, que certamente prejudica o país e sua economia em diversos aspectos, gera, ao mesmo tempo, uma oportunidade de expansão internacional para negócios brasileiros. Muitas startups de serviço e algumas de tecnologia podem se valer de uma mão de obra brasileira que hoje em dia está mais barata para compradores na Europa e nos Estados Unidos, para vender lá o que produzem aqui. Não são poucos os movimentos de expansão internacional acontecendo neste momento e, uma vez estabelecidas no exterior, estas companhias tendem a ver seu valuation subir e sua oferta de valor incrementar-se, algo sempre muito atrativo também para investidores.
A esperança em todo o mundo é que as vacinas possam ser aplicadas o quanto antes na maior parte da população, possibilitando uma volta gradual a uma vida menos restritiva, mais presencial e coletiva. Entretanto, da mesma forma que uma volta completa à normalidade pré-pandemia é descartada por muitos, o ecossistema de negócios deve sofrer alterações significativas em seu modus operandis, impulsionado por um ganho de produtividade, redução de custos, ampliação da oferta e flexibilização nas formas de trabalho. E são novamente as startups que, se fizerem bem o seu dever de casa, têm os maiores upsides possíveis na saída dessa crise global. Com agilidade, eficiência e flexibilidade, elas têm todo o potencial de capitalizar sobre estas tendências, fazendo crescer seus negócios de forma sustentável.
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